Nova lei dos estágios e suas consequências

A Lei 11.788 atualiza da Lei do Estágio. Para contribuir para o debate sobre a nova lei dos estágio, apresento um resumo do documento e um artigo que apresenta as primeiras consequências da sua aplicação.


Resumo da lei

A nova Lei do Estágio, já em vigor, define novos parâmetros para as contratações de Estagiários, abaixo os principais:

1) A carga horária está limitada a seis horas diárias/trinta horas semanais;

2) Estagiários têm direito à férias remuneradas - trinta dias - após doze meses de estágio na mesma Empresa ou, o proporcional ao tempo de estágio, se menos de um ano;

3) O tempo máximo de estágio na mesma Empresa é de dois anos, exceto quando tratar-se de Estagiário portador de deficiência;

4) A remuneração e a cessão do auxílio-transporte são compulsórias, exceto nos casos de estágios obrigatórios;

5) Profissionais Liberais com registros em seus respectivos Órgãos de Classe podem contratar Estagiários;

6) O capital segurado do Seguro de Acidentes Pessoais, cujo número da Apólice e nome da Seguradora precisam constar do Contrato de Estágio, deve ser compatível com os valores de mercado;

7) Um Supervisor de Estágio poderá supervisionar até dez Estagiários;

8) A Legislação estabelece no artigo 17º- exclusivamente para Estagiários de nível médio regular, 2º grau (colegial) - a proporcionalidade de contratações descrita abaixo:

I - de 1 (um) a 5 (cinco) empregados: 1 (um) estagiário;

II - de 6 (seis) a 10 (dez) empregados: até 2 (dois) estagiários;

III - de 11 (onze) a 25 (vinte e cinco) empregados: até 5 (cinco)estagiários;

IV - acima de 25 (vinte e cinco) empregados, até 20% (vinte por cento)de estagiários.

A Lei, considera quadro de pessoal, o conjunto de trabalhadores empregados existentes no estabelecimento do estágio.

Na hipótese da parte concedente contar com várias filiais ou estabelecimentos, os quantitativos previstos nos incisos deste artigo serão aplicados a cada um deles.

Quando o cálculo do percentual disposto no inciso III deste artigo resultar em fração, poderá ser arredondado para o número inteiro imediatamente superior.


Comentários à lei

A nova lei tem sido comentada por diversos setores da sociedade.

* Honório Pinheiro (Presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Fortaleza)

"A nova lei do estágio vai desestimular as contratações de alunos de nível médio. Vamos ter redução forte nas admissões, pois só é permitida no máximo a contratação de 20% de estagiários e 50% dessas vagas terão que ser preenchidas por portadores de necessidades especiais".

* Anelise Waldschmidt (Coordenadora de Estágio do Instituto Euvaldo Lodi)

“É necessário que o empregador entenda que o estagiário não é um funcionário comum. Trata-se de um estudante, em fase de aprendizado, que precisa de tempo para dedicar-se também às obrigações acadêmicas [...] É uma questão de adaptação, de entendimento da necessidade de um estagiário. Eles levam conhecimento teórico às empresas e desenvolvem ações inovadoras. [..] O estágio junto aos profissionais liberais amplia as oportunidades de aprendizado para os estudantes e beneficia essa classe de trabalhadores, que agora contará com o apoio de pessoas previamente preparadas].

Artigo comenta a lei

Um artigo publicado no Jornal Expresso da Noticia, relata alguns pormenores em relação à envolvente que esteve subjacente à nova lei, indentifica eventuais lacunas e prevê algumas de suas consequências.


Chiadeira contra lei do estágio não procede


A nova lei do estágio - Lei nº 11.788 - veio em boa hora. A lei anterior - Lei nº 6.494, de 7 de dezembro de 1977 - estava defesada e vinha sendo utilizada de forma abusiva em alguns segmentos.

Uma pesquisa divulgada pela Folha de S. Paulo em agosto, realizada pela Mercer em abril deste ano, revelou que só 39% das empresas dão férias aos estagiários. O vale-transporte também passa a ser obrigatório. Benefícios como auxílio-refeição e assistência médica continuam não sendo obrigatórios, embora sejam concedidos por muitas empresas.

Tão logo o projeto de lei foi aprovado, em agosto, iniciou-se uma "choradeira" vinda de alguns setores que utilizam esta mão-de-obra de forma mais intensiva. Os argumentos de que as relações de trabalho devem ser "flexíveis" e "desonerada de tributos" foram ventilados de forma insistente.

O fato de a nova lei estabelecer, no artigo 12, obrigatório o pagamento da "bolsa ou outra forma de contraprestação" causou calafrios em alguns "analistas". Entidades que fazem a intermediação nessa área se apressaram a alertar que o número de estágios oferecidos iria diminuir.

Na realidade, porém, a nova lei não criou nenhuma exigência absurda. Embora em pequeno número, é possível encontrar em alguns segmentos muito concorridos a prática de "estágios não remunerados".

Outra distorção que ocorria na vigência da lei anterior era a ausência de mecanismos de controle da quantidade de estagiários contratados. A nova lei estabelece, no artigo 17, o "número máximo de estagiários em relação ao quadro de pessoal das entidades concedentes". Talvez esta seja a disposição mais importante introduzida pela nova lei para coibir abusos. Não eram raras as queixas e desconfianças em relação a determinados setores onde o número de estagiários em atividade era excessivo em relação ao número de profissionais formados contratados.

E o que já estava se tornando ainda mais constrangedor: instituições públicas vinham fazendo contratações maciças, em muitos casos para a realização de tarefas repetitivas e meramente burocráticas.

Também merece registro a limitação à carga horária de seis horas diárias. Houve casos em que o Ministério Público do Trabalho duvidou das intenções "educacionais" de determinadas empresas que contratavam estagiários em demasia. Da mesma forma como foi criada a expressão "precarização do trabalho" para descrever as condições de trabalho aviltantes em vários setores, alguns estágios já vinham sendo chamados de "precários". Uma questão freqüente que muitos alunos se defrontam ao buscar um estágio diz respeito a identificar se estava diante de um "emprego mascarado", para suprimir os mais elementares direitos trabalhistas, sem compromisso com o aprendizado.

A situação chegou a estremecer as relações entre algumas instituições de ensino também. Muitas instituições de ensino fechavam os olhos para as propostas de estágio que chegavam as suas mãos. Outras, inclusive, faziam um "marketing", apregoando "facilidades" de se obter estágios.

Outras faculdades e universidades, mais criteriosas, ao notar a queda no desempenho e aprendizado dos alunos, decidiram proibir a realização de estágios por mais de seis horas por dia. Alguns cursos mais "elitizados" passaram a oferecer carga horária em tempo integral ou apenas turmas matutinas nos dois primeiros anos, como forma de "forçar" o aluno a se dedicar mais ao estudo.

Mas a estratégia de "fechar" as portas ao estágio elitizou em demasia essas instituições. E os estudantes das universidades que liberavam a realização de oito horas diárias de trabalho levavam vantagem sobre os alunos de outras instituições. Com a nova lei, há uma unificação dos limites da jornada de trabalho.

Por todos esses aspectos, pode-se concluir que a "chiadeira" que antecedeu a publicação da lei não se justifica. Agora, na prática, caso o Ministério de Trabalho tenha disposição e crie mecanismos de fiscalização eficientes, os limites estabelecidos no artigo 17 podem evitar práticas predatórias de utilização de mão de obra.

A nova lei se esfoça para "manter o caráter educacional do estágio". As empresas devem manter um funcionário de seu quadro pessoal para orientar e supervisionar até dez estagiários (no máximo). O profissional deve ser formado na mesma área dos estagiários.

As instituições de ensino terão mais responsabilidades no processo de concessão dos estágios. Faculdades e universidades deverão avaliar as instalações da de quem concede o estágio "e sua adequação à formação cultural e profissional do educando".
As instituições de ensino deverão, também, "indicar professor orientador, da área a ser desenvolvida no estágio, como responsável pelo acompanhamento e avaliação das atividades do estagiário". Esta regra talvez seja a mais importante para inibir estágios que pretendam burlar a lei, com a utilização de estagiários em tarefas repetitivas e desconectadas do aprendizado profissional.

O estagiário deverá ainda apresentar relatório das atividades a cada sei meses. Desta forma, havendo qualquer distorção, tanto a instituição, como o professor e o aluno podem detectar e registrar, por escrito, os fatores do estágio que não estejam de acordo com a legislação.

Um fator que faltou na nova lei diz respeito às contribuições previdenciárias. Apesar das mudanças que foram sendo impostas ao sistema previdenciário desde 1988, a Seguridade Social brasileira ainda é, em essência, um sistema público, com cobertura universal e cujos custos e pagamento de benefícios são suportados por toda a sociedade. Em que pese a proliferação de analistas que defendem o sucateamento do sistema previdenciário, o Regime Geral ainda é a principal fonte de sobrevivência dos aposentados brasileiros.

Muito se discute a respeito de "déficits" previdenciários. Assim, representaria um avanço a instituição da contribuição previdenciária, mesmo em porcentuais bastante reduzidos, incidente sobre os valores pagos a título de "bolsa ou outra forma de contraprestação", auxiliando na redução do propalado "déficit" da Previdência. Não é novidade também que um dos principais problemas da Seguridade é a permanência de pessoas excluídas do sistema previdenciário.

A inclusão dos estagiários no sistema previdenciário iria incorporar alguns milhões de segurados, um fator importante para a manutenção do equilíbrio das contas da Previdência. E para os estudantes haveria a contagem de "tempo de serviço" para a futura aposentadoria, evitando prejuízos no futuro.

Autor: Orozimbo de Assis (jornalista)


CONSEQUÊNCIAS DA PUBLICAÇÃO DA NOVA LEI DOS ESTÁGIOS

Lei de estágio causa queda em número de vagas

Ambigüidades da nova legislação, em vigor há 45 dias, foram reconhecidas pelo próprio Ministério do Trabalho

Alexandre Gonçalves e Simone Iwasso, de O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Em 45 dias, desde que a nova lei de estágio foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o número de vagas oferecidas no País caiu 40%, de acordo com levantamento da Associação Brasileira de Estágios (Abres). A oferta caiu de 55 mil postos mensais para 33 mil.

O motivo, segundo a entidade, é o desconhecimento das novas regras, que têm assustado e confundido as empresas e as instituições de ensino superior. Apenas o Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee) já fez cerca de 30 mil atendimentos para solucionar dúvidas de empresários, instituições de ensino e estudantes.

Além disso, a burocracia exigida para adaptar contratos e modificar as propostas pedagógicas dos cursos torna o processo ainda mais lento. "Acreditamos que levará cerca de dois anos para que a situação se normalize e a oferta volte ao normal", afirma Seme Arone Júnior, presidente da Abres. "Isso porque as faculdades não se prepararam e as empresas estão com medo.

Há muita falta de informação", diz ele. Arone Júnior, no entanto, acredita que a lei, apesar da confusão inicial, será benéfica para os estagiários, que terão mais garantias de respeito ao seu desenvolvimento educacional. Um dos pontos da lei que provocaram confusão e empacaram os estágios foi a determinação de que os estágios não obrigatórios constem do projeto pedagógico dos cursos de graduação - até então, isso não era requisito.

Desse modo, se a instituição ainda não atualizou seu projeto - e em algumas isso é um processo demorado, que depende de votação em conselhos universitários, por exemplo -, ela não poderá assinar ou renovar o contrato de estágio do aluno.

Outros pontos polêmicos são a jornada diária da atividade (de 8 para 6 horas semanais), o tempo de permanência no mesmo estágio (restrito a dois anos) e os benefícios obrigatórios.

O secretário de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho, Ezequiel Sousa do Nascimento, afirma que a pasta pretende publicar uma instrução normativa para dirimir as dúvidas em até 15 dias. "Vamos nos reunir terça e quarta-feira para redigir o texto", diz Nascimento.

Para tentar acabar com as polêmicas, o Ministério da Educação também se pronunciará oficialmente. A coordenadora de políticas públicas da Secretaria de Educação Profissional e Técnica do Ministério da Educação (MEC), Caetana Juracy Rezende Silva, que participou da elaboração da lei, diz que o MEC enviará até o fim do mês um comunicado às instituições de ensino com instruções práticas.

APLICAÇÃO - A falta de clareza de alguns artigos é mencionada mesmo por quem defende a nova lei. Coordenadora dos estágios do curso de Enfermagem do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo, Taís Fortes considera a lei um avanço por dificultar a utilização do estagiário como mão-de-obra barata. Mas tem dúvidas.

Ela não sabe, por exemplo, se o artigo 14, que afirma se aplicar "ao estágio a legislação relacionada à saúde e segurança no trabalho", implica a exigência de exames médicos admissionais e demissionais. Caetana explica que a intenção desse artigo não era exigir esses exames, mas garantir aos estagiários os instrumentos e procedimentos de segurança utilizados pelos funcionários da empresa.

A gerente jurídica e de desenvolvimento de projetos sociais do Ciee, Maria Nilce Mota, comemora a interpretação de Caetana, mas afirma que, até a publicação da instrução normativa, a entidade vai recomendar às empresas, de forma preventiva, a realização dos exames.
Maria Nilce considera que a diminuição na oferta de vagas é apenas temporária e só vai durar até as empresas e instituições fazerem os ajustes.

O assessor jurídico do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), José Roberto Covac, afirma que a lei mais atrapalha do que ajuda os estagiários.

Ele argumenta que a nova lei engessa as relações entre estudante, escola e empresa. "Alguns estágios tornam-se inviáveis com a carga horária de seis horas e o período máximo de dois anos na mesma empresa." Ele afirma que não seria necessário criar uma nova lei: bastaria fiscalizar as condições de atividade dos estagiários.

Caetana entende que, no início, a lei pode dar a impressão de que prejudica o estagiário. "Afinal, alguns se submetem a um estágio precário porque precisam da remuneração", aponta. "Mas, depois, é fácil compreender que todos são beneficiados quando não se reforça a precarização das condições de trabalho."


Postado por João José Saraiva da Fonseca em 5 de outubro de 2008 e re-postado em 26 de novembro de 2008

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